EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR
Processo n.º ________/_______ (___ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE ___________)
________________________________, brasileiro, casado, Defensor Público do Estado de São Paulo, com endereço para intimações à Rua _____________________, vem impetrar ordem de HABEAS CORPUS com pedido de LIMINAR em favor do paciente ___________________________, brasileiro, portador do RG de nº ________________ e do CPF de nº __________________, decorrente de decisão proferida pelo M.M. JUÍZO DE DIREITO DA ____ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE ______________, nos autos de n.º _______/_________, e apresenta, a seguir, os fatos e os fundamentos jurídicos da impetração:
DA SÍNTESE FÁTICA
O paciente está sendo processado pela suposta prática delitos contra a ordem tributária no período compreendido entre julho 1999 e janeiro de 2000.
Consta dos autos que a denúncia foi regularmente oferecida e recebida, sendo determinada a citação do paciente.
Todavia, não tendo sido localizado para citação pessoal, foi determinada sua citação editalícia.
Escoado o prazo do edital sem que o paciente comparecesse em juízo ou então constituísse defensor, os autos foram remetidos à Defensoria Pública para o oferecimento de resposta à acusação.
O Defensor Público ora impetrante então se manifestou no sentido de que não seria o momento oportuno para o oferecimento da resposta escrita, por expressa previsão legal.
Por seu turno, o Ministério Público pugnou pela suspensão do processo (artigo 366 do Código de Processo Penal), com produção antecipada de provas. Além disso, requereu a prisão preventiva do paciente, bem como pleiteou a nova remessa dos autos à Defensoria Pública para apresentação de resposta escrita, entendendo que se trataria de medida necessária, a despeito de se tratar de citação editalícia.
O juízo coator acolheu o pleito ministerial, suspendendo o curso da ação penal e decretando a prisão preventiva do paciente. Também entendeu que não prevaleceria o posicionamento da Defensoria, entendendo como impreterível a resposta à acusação para que o juízo pudesse decidir acerca do recebimento ou não da denúncia. Além, disso, entendeu que a resposta seria essencial para eventual antecipação de provas. Por tais razões, determinou nova remessa dos autos à Defensoria, e em caso de não apresentação de defesa, que fosse oficiada a OAB para indicação de advogado.
Mais uma vez, a Defensoria Pública se manifestou, entendendo não ser o momento oportuno para apresentação da resposta escrita, e que os direitos do acusado estariam resguardados pelo acompanhamento do feito por Defensor Público.
Finalmente, o juízo coator decidiu que diante da negativa da Defensoria em apresentar resposta à acusação, deveria a Instituição indicar advogado conveniado para patrocinar os interesses do paciente no prazo de 05 dias. É contra resta decisão que ora se insurge o impetrante, posto que violadora dos direitos do paciente.
DA GARANTIA DA AMPLA DEFESA. DO EXERCÍCIO FUNDAMENTADO DA DEFESA TÉCNICA.
Analisando-se com cautela os documentos em anexo, observa-se que a decisão ora guerreada viola a garantia do paciente à ampla defesa, já que tenta obrigar a Defensoria – ou então, o advogado conveniado cuja indicação foi solicitada, em absurda substituição ao Defensor natural – a apresentar resposta à acusação sem que o acusado tenha oportunidade de fornecer elementos úteis à sua defesa.
A situação é absurda, pois é o mesmo que obrigar o acusado a apresentar resposta sem prévia consulta à defesa técnica – acusado este que, frise-se, talvez nem saiba que está sendo processado.
E é justamente para evitar tamanho absurdo que o legislador previu, no Código de Processo Penal, que o prazo para o oferecimento de resposta escrita ao réu citado por edital só começa a fluir a partir do seu comparecimento em juízo, ou do momento em que constitui advogado. Tal medida, obviamente, assegura ao acusado a ampla defesa.
Com efeito, o §2º do art. 396-A do Código de Processo Penal versa que “não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias.” (g.n.)
Por seu turno, o parágrafo único do art. 396 do mesmo diploma processual dispõe que “no caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído” (g.n.).
Portanto, da interpretação conjugada de ambos dispositivos se conclui que nos casos de citação editalícia os autos serão remetidos à Defensoria Pública para o oferecimento de resposta à acusação somente após o decurso do prazo de 10 dias contado do eventual comparecimento pessoal do acusado ou de seu advogado constituído.
Todavia, no presente caso não houve o comparecimento de nenhum deles, sendo nítido que o prazo para o oferecimento de defesa ainda sequer se iniciou.
Ressalte-se que a nulidade apontada pelo Ministério Público em fls. _____/______, decorrente da ausência de resposta escrita, somente ocorre quando, decorrido o prazo para o oferecimento da citada defesa, o juiz deixa de remeter os autos à Defensoria Pública ou de indicar advogado para fazê-lo. Todavia, não é o caso presente, em que o prazo para a resposta sequer se iniciou, já que, repise-se, nos termos do parágrafo único do art. 396 do CPP este somente começa a fluir para o réu citado por edital a partir do seu comparecimento pessoal ou do de advogado por ele constituído.
Assim, para evitar qualquer nulidade e assegurar o direito de defesa do acusado, basta que os atos processuais sejam acompanhados pela Defensoria Pública, como vinha ocorrendo, até a prolação da decisão judicial ora impugnada.
Além disso, ressalte-se que em fls. _____ o Ministério Público cita entendimento doutrinário onde se sustenta que a defesa preliminar seria imprescindível, mesmo em caso de acusado citado por edital. Todavia, o posicionamento apresentado pelo Parquet diz respeito ao rito especial da Lei 11.343/2006, onde a defesa preliminar ocorre antes do recebimento da denúncia, sendo que muitas vezes a defesa neste momento traz argumentos acerca do não recebimento da peça acusatória. Obviamente que não se trata da situação presente, em que o processo tramita pelo Rito Ordinário do Código de Processo Penal, com a denúncia já tendo sido recebida.
Por outro lado, o andamento da ação penal foi suspenso, nos termos do artigo 366 do Código de Processo Penal, não havendo motivos para a apresentação de resposta escrita neste momento, justamente por estar sustado o andamento processual em relação ao acusado, ora paciente, Sr.__________ .
Sobre o tema, já se debruçou a jurisprudência:
“HABEAS CORPUS. Crime tributário. Impetração objetivando reforma da decisão que, ante a recusa do Defensor Público em apresentar defesa escrita, determinou sua substituição por advogado dativo. Acolhimento. Caso em que o processo se encontra suspenso (artigo 366 do CPP), não fluindo, portanto, o prazo para defesa escrita, até que o réu compareça aos autos ou constitua advogado. Constrangimento ilegal caracterizado. Ordem concedida. (HABEAS CORPUS Nº 0146673-45-2012-8.26.0000 – 9ª Câmara Criminal/TJSP)”
Importante citar trecho do brilhante voto proferido pelo Douto Desembargador Dr. Sérgio Coelho, relator do habeas corpus supracitado:
“No caso dos autos, ante o não comparecimento do réu ou da constituição de advogado após a citação editalícia, o feito ficou suspenso. Não corre, portanto, o prazo de dez dias para apresentação de defesa escrita. Até porque, segundo o artigo 396, parágrafo único, “no caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído”, o que, como já acentuado, ainda não ocorreu nos presente caso. [...] Vale referir, mais uma vez, o ilustrado parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça: “importante e fundamental oportunidade de defesa foi dada ao paciente que, através de competente defensor público e alicerçada no artigo 396, parágrafo único, do CPP, deixou de oferecer a resposta à acusação diga-se, neste momento processual. Comparecendo pessoalmente o paciente ou constituindo defensor, o prazo para a defesa começará a fluir, nos termos do artigo 396, parágrafo único, do Código de Processo Penal. Assim, embasada neste dispositivo legal a recusa do defensor público de ofertar resposta à acusação. Caso a autoridade impetrada determine a produção antecipada das provas urgentes, o defensor público impetrante deverá, sob pena de nulidade, ser intimado para a audiência, em respeito à ampla defesa e ao contraditório. Posteriormente, o processo deverá permanecer suspenso até comparecimento do acusado ou constituição de advogado, nos termos do artigo 366, do CPP. Só, então, o prazo para a defesa começará a fluir” (fls. 59/60).”
Logo, conforme bem salientado nas citações acima, e confirmando a tese esposada pelo impetrante, o prazo para resposta à acusação sequer começou a correr. Não comparecendo o acusado, não corre tal prazo, e, portanto, equivocada a decisão guerreada.
Ressalte-se que no processo não há necessidade ou mesmo possibilidade de atropelos e de supressão de garantias constitucionais, especialmente pela possibilidade, no presente caso, de o paciente desconhecer que está sendo processado. As garantias do contraditório e da ampla defesa são das mais sublimes e fundamentais dentro do direito processual, sobretudo no processo penal, onde se lida com a liberdade individual. Assim, é preciso cautela, não sendo admissível que tais garantias sejam vilipendiadas para que o procedimento possa ter andamento.
Também se observa que mesmo a eventual antecipação da produção de prova mencionada pelo Juízo coator (por mais absurdo que seja tal instituto) independe do oferecimento da resposta escrita, visto que o artigo 156, inciso I, do Código de Processo Penal autoriza que o juiz o faça mesmo antes de iniciada a ação penal:
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; (g.n.)
Finalmente, ressalte-se que a não apresentação da resposta escrita no presente momento nada mais é do que manifestação legítima da defesa técnica, que, não desejando causar prejuízos ao paciente – que, se for localizado, poderá eventualmente fornecer subsídios concretos para uma adequada resposta escrita –, firma este posicionamento justamente para assegurar os direitos do réu. Como já dito, nulidade haveria se o réu estivesse indefeso, o que não é o caso, já que a Defensoria vem atuando no feito, manifestando-se fundamentadamente e agora, de forma aguerrida, levando a questão a este E. Tribunal. Muito mais simples seria o oferecimento de uma resposta à acusação genérica e vazia de conteúdo, somente para atender à formalidade equivocadamente sustentada pelo Parquet e pelo juízo coator. Mas, felizmente, este não é o papel do Defensor Público. Muito pelo contrário, o Defensor precisa resguardar os direitos de seus assistidos, opondo-se a todo tipo de decisão que lhe seja prejudicial, e é justamente por isso que se insurge através do presente writ.
Relevante pontuar que a 8ª Câmara de Direito Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, em caso semelhante ao presente, CONCEDEU A LIMINAR em mandado de segurança em caso semelhante, em que havia afastamento do defensor natural, decidindo da seguinte forma:
“DESPACHO Mandado de Segurança Processo nº 990.09.177827-3 Relator(a): Alberto Mariz de Oliveira Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Criminal Impetrante : FLÁVIA D'URSO 1- Trata-se de mandado de segurança impetrado pela ilustre Defensora Pública Dra. FLÁVIA D'URSO, contra o r. despacho proferido pelo N. Juízo de Direito da Vara das Execuções Criminais da Comarca de São Paulo, que, nos autos de incidente de execução penal apensado ao processo executório de número 559.114, referente ao sentenciado MARCIEL CELESTINO DE OLIVEIRA, declarou o executado indefeso, nos termos do artigo 261, do Código de Processo Penal e determinou que se oficiasse "à DD. Defensoria Pública Geral do Estado solicitando a indicação de Defensor Público para viabilizar o prosseguimento do feito" (fls. 25/26) . Requereu "seja concedida a medida liminar para obstar a destituição da impetrante do processo de execução penal em epígrafe do 'mandamus' assinalado e, no mérito, concedida a ordem para o mesmo fim em termos definitivos" (fls. 08) . Respeitado o entendimento do N. Juízo impetrado, entendo que estão presentes os pressupostos necessários para o deferimento da medida pleiteada . De fato, a leitura da peça de fls. 20/22, subscrita pela d. Defensora Pública permite concluir que foi defendida uma tese que, pode não ser a que prevaleça, mas é jurídica e está bem fundamentada . Aliás, o r. despacho impetrado, também de forma jurídica e bem fundamentada, afastou os argumentos expostos pela Defensoria em uma discussão elevada, que é até saudável para a Justiça . Assim, a um primeiro exame e com o devido respeito, a destituição impugnada, em tese, pode ferir os princípios constitucionais elencados pela d. impetrante, razão pela qual CONCEDO a liminar para obstar a destituição da Defensora Pública FLÁVIA D'URSO, até o julgamento deste "mandamus". Requisitem-se informações . Atendida a requisição acima referida, remeta-se o presente à Douta Procuradoria Geral de Justiça . São Paulo, 20 de julho de 2.009. ALBERTO MARIZ DE OLIVEIRA Relator São Paulo, 20 de julho de 2009 Alberto Mariz de Oliveira”. |
Logo, considerando que a denúncia já foi recebida; que o transcurso do prazo para o oferecimento de resposta escrita ainda não se iniciou; e finalmente, considerando que o posicionamento da Defensoria Pública nada mais é do que manifestação fundamentada da defesa técnica, em prol do assistido, ora paciente, é que deve ser concedida a ordem, cassando-se a decisão impugnada, e mantendo-se a atuação do defensor público ora impetrante no caso, sem que seja obrigado a apresentar resposta escrita antes do comparecimento – ou da citação pessoal – do paciente.
DA CONCESSÃO DA LIMINAR
Cristalina é a presença dos pressupostos para a concessão da LIMINAR, quais sejam, fumus boni juris e periculum in mora.
O fumus boni iuris já está demonstrado ao longo da fundamentação do pedido, sendo que requeremos o acolhimento dos argumentos expostos neste writ, em face da clara afronta aos dispositivos legais aplicáveis a este caso.
Por sua vez, o periculum in mora se mostra com a iminente e manifesta violação do direito de defesa do acusado. No caso, e considerando que há determinação judicial para indicação do advogado dativo no exíguo prazo de 05 dias, decisão esta que precisaria ser cumprida em curto prazo, mais do que evidente o periculum in mora.
Além disso, e o principal, está-se afastando a defesa técnica, que está sendo fundamentadamente exercida em prol do paciente, sendo que a determinação de indicação de advogado conveniado trará prejuízos incalculáveis ao paciente, que será obrigado a “se defender” sem ter qualquer contato com seu patrono, sendo inclusive possível que sequer conheça o processo que contra ele tramita.
Por tais razões, a liminar deve ser de imediato deferida, para suspender o efeito da decisão impugnada até final julgamento do presente writ.
DOS PEDIDOS
Logo, por todo o exposto, requer seja concedida a ordem em caráter liminar, suspendendo os efeitos da decisão que determinou que a Defensoria Pública indicasse advogado conveniado para atuar em prol do paciente, com a consequente manutenção da Defensoria na realização da defesa técnica, e ao final, quando da análise do mérito, requer seja definitivamente concedida a ordem para cassar a decisão impugnada, mantendo-se a atuação direta da Defensoria Pública no caso, sem que seja obrigada a apresentar resposta escrita antes do comparecimento – ou da citação pessoal – do paciente.
_____________, _____ de __________ de __________.
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Defensor Público do Estado
Defensor Público do Estado de São Paulo. Colaborador do Núcleo Especializado de Combate à Discriminação, Racismo e Preconceito da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Graduado em Direito pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) - Campus Franca. Especialista em Ciências Penais.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BAGHIM, Bruno Bortolucci. Habeas Corpus contra decisão que destitui defensor público que se recusa a oferecer resposta à acusação em caso de réu citado por edital Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 out 2013, 14:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Peças Jurídicas/37036/habeas-corpus-contra-decisao-que-destitui-defensor-publico-que-se-recusa-a-oferecer-resposta-a-acusacao-em-caso-de-reu-citado-por-edital. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Conteúdo Jurídico
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